quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Coragem e Resitência

Ontem, trabalando de madrugada (sim, eu trabalho de madrugada!), pesquisando na Internet, encontrei o blog do Jean Willis. Quem? Não se lembra? Ele venceu a Edição no. 6 do BBB. Aliás, ele, o Diego Alemão e o Max, foram os únicos vencedores desse "jogo" que não eram pessoas xucras e sem o mínimo de instrução e cultura geral.


Pois bem, dei uma olhada no blog, vasculhei algumas coisas que ele escreve. Quem viu o programa sabe que ele é professor universitário e homossexual assumidíssimo. Por isso mesmo, resolvi copiar o texto e colocá-lo aqui, até para dar um suspiro a mais no assunto, visto que os cães ladram, a caravana passa, mas algumas coisas permanecem a "lesma lerda"!


Coragem e resistência

Aviso: texto grande que só pode ser entendido quando lido até o fim
Para Tico Santacruz, Nizo Neto, Vera Damato, Henrique Blecher e Fuca.

Eu não gosto de futebol. Perdoem-me os amigos e conhecidos que gostam deste esporte e/ou o pratica (em especial, Marcelo do Blogol), mas, eu detesto futebol. E este detestar não é gratuito nem deixa de ser recíproco. Na verdade, ele (o detestar) é reativo: o futebol me rejeitou antes de eu começar a detestá-lo: ainda criança, com mais ou menos oito anos de idade, nas poucas vezes em que tentei me aproximar do futebol, percebi que o meio não tolerava a presença de meninas nem de meninos diferentes (sim, uma criança de mais ou menos oito anos pode não se identificar ou se perceber como um homossexual, mas, com certeza, já se percebe com um diferente). E dessa intolerância do futebol em relação às meninas e aos “meninos que se parecem ou agem como meninas”, faziam parte os xingamentos, as humilhações e surras.
Como forma de sociabilidade masculina (entendam como “sociabilidade masculina” a vida dos homens entre si), o futebol é fundamentalmente misógino (ou seja, é avesso às mulheres ou à presença delas, como mostram o deboche e a indiferença dos torcedores e patrocinadores para com o futebol feminino, ainda que muitas jogadoras sejam melhores que muitos ronaldos, adrianos e robinhos da vida) e homofóbico, ou seja, o futebol repousa igualmente na exclusão da homossexualidade. Os xingamentos e expressões usados por torcedores e jogadores para desestabilizar e humilhar os adversários – “time de viados”, “clube de boiolas”, “baitola”, “frango”, “chupa pau”, “vá tomar no cu” e etc. - mostram que a masculinidade se constrói e se afirma publicamente contra a homossexualidade.
Nesse sentido, o futebol é igual às Forças Armadas; é igual ao Exército Brasileiro, que, na última quinta-feira, dia 25 de setembro (2008), por meio da Justiça Militar, condenou o sargento Laci à prisão por deserção. Para quem não se lembra, o sargento Laci é um dos dois militares que se assumiram gays na capa da revista Época (o outro é seu companheiro, Fernando Alcântara de Figueiredo). O sargento Laci foi condenado porque se assumiu; porque revelou o que todo mundo sabe, mas, não diz: que nas Forças Armadas, assim como no futebol, há também “viados”, “boiolas”, “bonecas”, “quem dê o cu” e “chupe pica”. Ao se assumir gay, o sargento Laci mostrou que os homossexuais estão aptos a cumprir qualquer função na sociedade, inclusive a defesa da mesma.
Embora o futebol e as Forças Armadas proscrevam a homossexualidade das relações que prescrevem a jogadores e soldados, há tanto no futebol quanto nas Forças Armadas uma espécie de erotismo homossexual generalizado.
Os sargentos Laci e Fernando são exemplos de coragem e resistência. Mas, é preciso lembrar – como já o fez a ensaísta norte-americana Susan Sontag - que a coragem e a resistência não têm valor em si mesmas, pois um canalha que xinga ou espanca em público um homossexual não deixa de ser corajoso. É o conteúdo da coragem e da resistência que determina seus méritos. Coragem e resistência só têm valor quando correspondem a princípios morais e éticos, ou seja, quando correspondem ao bem e ao amor. Por isso é que posso dizer que os sargentos Laci e Fernando são exemplos de coragem e resistência.
Sim, agir e resistir por princípios. É o que faço desde que ouvi a primeira ofensa; o primeiro xingamento; a primeira injúria pelo fato de eu ser um menino diferente. Resistir, sim, pois, de lá pra cá, as ofensas nunca cessaram, mesmo depois que as audiências se identificaram comigo no BBB. As injúrias contra os homossexuais nunca acabam e elas se expressam de formas variadas: das piadas grosseiras das comédias em pé às agressões físicas, passando pelo fechamento de portas de acesso a trabalhos.
Por isso, alguns de nós agimos e resistimos. E faz parte dessa resistência a identificação dos gays com as mulheres e aversão dos “sapatões” aos homens heterossexuais. Os gays têm motivo para se identificarem com as mulheres (ainda que uma ou outra “bicha” seja misógina): ambos são vítimas dos efeitos perniciosos da dominação masculina. As lésbicas, principalmente as mais masculinizadas, por sua vez, não têm motivo algum para se identificar com os machos que as detestam tanto pelo fato de elas serem mulheres diferentes quanto pelo fato de elas gostarem de mulheres (ou seja, de serem concorrentes dos machos na arte da conquista amorosa).
Resistir por princípios morais e éticos à opressão (e, às vezes, à caridade) dos que nos detestam é o que nos restam. Se eles nos querem mortos ou calados, terão que ralar muito para conseguir. E eu me lembrei agora de uns versos de Mário Quintana - meu poeta preferido porque generoso com o leitor – versos que me comovem: “Da vez primeira que me assassinaram/ Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.../ Depois, de cada vez que me mataram,/ Foram levando qualquer coisa minha/ (...) / Vinde, corvos, chacais, ladrões da estrada! Ah! Desta mão, avaramente adunca/ Ninguém há de arrancar-me a luz sagrada”.

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