Pense rápido: você gosta de cinema nacional? Quantos filmes brasileiros você já assistiu esse ano? Para esta pergunta, podem até existir muitas respostas, mas uma delas vive sempre na boca da maioria das pessoas: “Eu não assisto filme brasileiro porque só tem sacanagem, palavrão, ou pobreza!”. Como sempre defendo o cinema nacional, ainda que algumas produções sejam realmente muito clichês, posso dizer que essa afirmação não é totalmente falsa. Pelo contrário. É bem verdade que, depois da chamada “Retomada” do cinema nacional, a partir de 1994, hoje se vê muito mais obras cinematográficas pipocando do que anteriormente. E melhor que isso, hoje podemos ter “clássicos do cinema nacional” como Tropa de Elite, Meu nome não é Jonny, O que é isso companheiro? E muitos outros, só para citar os filmes que levaram uma grande bilheteria nos últimos anos.
Não gosto muito quando as pessoas dizem que o cinema nacional é meramente palavrão e sacanagem. Infelizmente, nossos filmes ainda são bastante marcados e estigmatizados por causa das porno-chanchadas das décadas de 50 e 70. Pois essas eram as produções que sempre conseguiam dinheiro para sua produção, tendo, inclusive, estúdio para isso.
No cinema da Retomada, o poder público criou a Lei Rouanet (que já virou tema de discussão aqui no nosso blog), que patrocina, com dinheiro público, as produções mais variadas, para poder fazer chegar ao povo, que paga os impostos para existir Lei Rouanet, produções de boa qualidade. No entanto, algumas dessas produções continuam presas ao passado e estimulando, na tela do cinema, a pornografia, que, se não é gratuita, está sempre presente em muitos filmes.
Pois bem, no último dia 08/10, minutos antes de começar a sessão de Todo mudo tem problemas sexuais durante o Festival do Rio, o ator Pedro Cardoso, o Agostinho da Grande Família, subiu ao palco e leu um manifesto contra a utilização de atores e atrizes nus em quase todo filme, novela, programas ditos “familiares”, comercial, etc.
Deu o que falar. Muitos tacharam Cardoso de puritano, moralista, que atacou diversas pessoas, etc. A grande questão é que, o debate que Pedro Cardoso está propondo, vai além de qualquer prerrogativa moralista que possa existir. Segundo ele, várias atrizes – principalmente as mais novas – são forçadas a exibir seus corpos em nome de desculpas esfarrapadas como “vai ser respeitoso”, “a história pede”, “vai ser discreto”, e coisas que vão além da imaginação. Na verdade, Cardoso quer suscitar na classe artística o que anda reprimido em muitos deles, mas por medo de não conseguirem emprego, submetem-se a situações que deixam de se ser dramaturgia e caem dentro do campo pornográfico.
Aí, qualquer um pode alegar que isso é uma besteira, que não existe como acabar com isso pois, já está estabelecido que muitos programas exploram tais imagens e que isso faz parte do imaginário popular, ligar a televisão e encontrar as “coleguinhas” do Caldeirão do Huck; as chacretes do Chacrinha; as assistentes de palco que sempre aparecem semi-nuas em muitos programas. Mas, é aí que está o problema! Por que será que devem existir mulheres semi-nuas num programa para “atrair a audiência”? Como isso não seria prostituição? Por que num filme, nacional ou “róliudiano”, é preciso que uma mulher, ou um homem, mostrem uma parte de seus corpos, para o filme atrair dinheiro? E quem ganha mais dinheiro quando um ator aparece nu? O ator ou o produtor / diretor? Novamente insisto, não deixa de ser prostituição.
Se quiséssemos, ou se vamos constituir uma sociedade moralista, que irá repudiar e criticar programas que abusam de cenas que exploram a sexualidade de uma pessoa, isso é uma outra história. Mas se nos colocarmos sempre no papel que não estamos, quantos de nós seriam capazes de tirar a roupa para que muitos vissem? Lembra daquela história velha de que o cara, ou a moça que resolve ser ator, se enfiar de fazer teatro, ganhava a pecha de puta ou viado? Será que seríamos tão condescendentes se uma filha nossa tivesse que mostrar os peitinhos, ou a bunda na televisão? Por mais que se diga que hoje isso é um trabalho como outro qualquer, eu digo que não é! Não é porque simplesmente banalizamos o comportamento promíscuo. Achamos bonitinho quando uma criança de 3 ou 5 anos dança “creu”, alguns fazem planos para suas filhas se tornarem “modelos/atrizes”; achamos normal ligar a TV e assistir um programa que tem como assunto principal a mulher com as maiores próteses de silicone, jantar com a família assistindo uma novela onde um personagem tem relações sexuais com outros dois personagens. E a lista é infinita.
A tal da “sociedade globalizada” globalizou o mal gosto, o exibicionismo – afinal, assistir durante 3 meses o desfile de mulheres de biquíni dentro de uma casa fingindo serem o que são, ou que não são, é rotina todo ano. Desejamos estar num programa, que paga um milhão de Reais, mostrando qualquer intimidade nossa. Mostrando aquilo que muitos não tem coragem de mostrar para a pessoa mais próxima. Não seria isso prostituição também?
Por essas e outras, leiam o manifesto de Pedro Cardoso “linkado” nesse artigo. Tire sua própria conclusão. E se for o caso, apóie-o. Se não, gere o debate, converse com outras pessoas para saber sua opinião. O bom e velho Sócrates, jamais escreveu nada, mas deixou para a eternidade o legado do “Conhece a ti mesmo”. Fazia isso indagando as pessoas sobre suas certezas, até estas perceberem que não há um conceito fechado, não há nada que não possa mudar e que, na verdade, elas mesmas tinham dúvidas sobre suas certezas.
Pedro Cardoso levantou uma bandeira que é preciso ser carregada por muitos. Se você também não suporta mais a apelação e o erotismo gratuito nos programas que vê, dê sua contribuição escrevendo para esses programas (afinal, muitos tem páginas na Internet) e manifeste seu descontentamento. Pense: como pode uma editora, que possui uma revista que cobra moralidade política dos governantes, também editar uma revista que exibe mulheres nuas todos os meses?
O primeiro passo foi dado por Cardoso, seguir o caminho que ele aponta não é uma escolha infrutífera, mas um dever cívico se quisermos ter uma sociedade onde ter bundas e seios grandes não são o ápice da escala social. Onde mostrar e ostentar bundas e seios grandes não é o único modo de “vencer” na vida.
Abraços,
Bruno Daesse.
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